Alerta

Nenhuma mãe merece perder um filho

O silêncio que grita no peito do jovem que ele não fala


Mulher com as mãos no rosto
Foto: Reprodução
Por Drika Oliveira

Publicado em 17/04/2025 às 16:04,
atualizado em 18/04/2025 às 08:46

Atenção, internauta do NaTelinha:  Se você se sente extremamente sobrecarregado, ansioso e depressivo ou pensa em se machucar ou provocar algum dano físico a si próprio, procure um médico, psicólogo ou algum familiar para ajudá-lo, e não esqueça do CVV - Centro de Valorização da Vida. Ligue 188.

 

Tem uma dor silenciosa tomando conta dos nossos jovens. Uma dor que não posta foto, não faz dancinha no TikTok, não responde mensagem no WhatsApp. Uma dor que, quando a gente percebe, já levou tudo. Inclusive a vida.

Estamos vivendo uma epidemia de tristeza disfarçada. E ninguém fala disso com a seriedade que merece. Preferem tratar como tabu, como drama, como exagero adolescente. Mas não é. É real. E está acontecendo bem debaixo do nosso nariz. E muitas vezes, nós pais e mães amorosos não temos o entendimento necessário para captar, sacar e entender o turbilhão de emoções que se passa no coração dos nossos filhos. Essa que é a verdade.

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A cada semana, uma nova história. Um jovem cheio de potencial, com uma vida inteira pela frente, que simplesmente desiste. Não porque era fraco. Não porque "faltou Deus". Mas porque não encontrou espaço seguro pra existir do jeito que era. Porque gritou em silêncio e ninguém ouviu. Porque o mundo anda cruel demais com quem sente demais.

Só essa semana fiquei sabendo de 3 casos envolvendo filhos de colegas que desistiram da vida. Em um caso no ano passado, uma garota de 15 anos, outra de 17...

Mas um caso específico, me acabou pois aconteceu com o filho de uma grande amiga. Uma mãe batalhadora, amorosa, cheia de orgulho e afeto com o filho, e que sempre se mostrou muito atenta a ele. Um garoto de 16 anos, lindo, amado e com uma vida inteira pela frente. Acompanhei pela internet seu nascimento e crescimento... E sempre via como essa mãe era amável e devotada ao filho. Realmente esse caso foi, e está sendo chocante e triste pois eu como mãe não consigo mensurar sua dor.

A internet pode matar

A internet, que um dia prometeu ser ponte, virou calabouço. Ali, se mede valor por curtida, beleza por filtro, felicidade por número de seguidores. Um universo paralelo onde todo mundo parece feliz, bem-sucedido, sarado, amado. E quem não cabe nesse molde sente que tem algo errado consigo.

Spoiler: o erro não é da pessoa. O erro é desse mundo irreal e desonesto onde a comparação virou passatempo e a crueldade e falta de empatia e carinho é premiada com engajamento e likes.

E olha que eu sempre fui uma pessoa que defendeu a internet de maneira ampla e árdua. Hoje penso que, se tivesse filhos menores, tentaria deixá-los o mais fora possível desse mundo digital, o quanto mais fosse possível. Claro que também penso que não conseguiria, pois, nesse mundo atual, é quase impossível blindar nossos filhos quanto ao uso de tecnologias: se não deixamos em casa, eles têm colegas na escola e etc… Sim, amigos, é difícil ser mãe e pai nesse mundo atual.

 

A crueldade na internet

Tem jovem que acorda e, antes mesmo de escovar os dentes, já foi chamado de feio, gordo, inútil, gay e muitas outras coisas por estranhos, por robôs... por colegas de escola escondidos atrás de perfis fake. É o bullying 4.0: não precisa mais da hora do recreio, do corredor vazio, da risadinha no fundo da sala. Agora ele invade o quarto, a mente, o coração e causa um sentimento tão grande de inutilidade que é difícil olhar praquele mundo perfeito da internet e constatar que a sua própria realidade é tão diferente.

É a pressão para dar certo, para ser alguém, para não decepcionar. É o mundo pedindo desempenho o tempo todo e oferecendo afeto de menos. É o Mundo dizendo “você não tem idade pra ter depressão” enquanto entrega um boletim de guerra diária para quem só queria um pouco de paz.

A pergunta que ecoa, depois da tragédia, é sempre a mesma: “Por quê?”

Por que um jovem com tanto pela frente decide que não quer mais continuar?

E a resposta é tão complexa quanto dolorosa: porque o mundo, do jeito que está, tem sido pesado demais pra quem ainda está aprendendo a viver.

Ele sofreu bullying na escola ou na internet? Ela se apaixonou e tomou um fora? Ele se descobriu gay e está com medo de contar para a família ou tem medo do que a sociedade pode pensar? Ele brigou com alguém e está chateado? Ele se sente abandonado por alguém? Está com depressão e não demonstra?

São tantas perguntas sem respostas, que nos faz sentir apenas uma coisa: culpa.

Hoje, ser jovem é carregar expectativas que não cabem no peito. É ouvir desde cedo que precisa ser excelente, produtivo, bonito, amável, conectado, resiliente, bem resolvido — tudo ao mesmo tempo. É viver num looping de cobrança que começa na escola, passa pela internet e termina dentro da própria cabeça.

Nossos jovens estão exaustos.

Exaustos de fingir. Exaustos de se comparar. Exaustos de não serem ouvidos.

Vivem num mundo que finge estar conectado, mas que tem medo de conversas reais. Que responde “vai passar” pra uma dor que já virou crônica. Que chama de "drama" o que é, muitas vezes, um grito por socorro.

E sim, a internet - essa terra de ninguém - tem sua enorme parcela de culpa.

Ali, a comparação é constante. A validação é um vício. E a exposição é cruel.

Basta um tropeço, um “defeito”, uma palavra mal colocada, e o tribunal do feed se instala, sem defesa nem misericórdia. Jovens viram meme. Viram alvo. Viram estatística.

Mas não dá pra jogar tudo no colo das redes sociais. O buraco é mais embaixo.

Tem a escola que não ensina a lidar com sentimentos.

Tem o sistema de saúde que ignora a dor psíquica.

Tem as famílias que mesmo amorosas, ficam sem ferramentas para lidar com esse novo mundo cruel, estão sem tempo (porque precisa colocar comida na mesa, e dar ao seus dignidade para sobreviver)

E tem, claro, o silêncio.

Esse silêncio mortal que envolve tudo — até que vire luto.

Mas atenção: esse texto não é pra julgar. Muito menos julgar uma mãe, um pai, uma família que dá o sangue pra poder dar o melhor para seus filhos.

É pra pedir. Pedir que a gente pare tudo por um minuto e se pergunte:

“Quantos jovens ainda vão precisar ir embora pra que a gente escute os que querem ficar?”

Porque eles não querem morrer.

Eles querem alívio.

Eles querem paz.

Eles querem ser vistos de verdade — com seus medos, suas falhas, seus excessos, suas dúvidas.

E isso começa com a gente.

Pais, professores, amigos, lideranças, autoridades:

Não dá mais pra tratar sofrimento emocional como frescura.

Não dá mais pra deixar adolescente implorando por ajuda com sinais sutis que ninguém está treinado pra reconhecer.

Não dá mais pra esconder esse assunto debaixo do tapete porque dói.

O que dói precisa ser dito.

O que sufoca precisa ser nomeado.

O que mata precisa ser enfrentado.

Eles não estão indo embora porque não aguentam a vida.

Eles estão indo embora porque a vida, muitas vezes, não tem oferecido acolhimento suficiente pra quem ainda tá aprendendo a viver, porque ninguém devia ter que morrer pra ser levado a sério.

Repito:

A culpa não é dos pais, nem dos professores, nem do jovem. É de um sistema inteiro que virou as costas pra saúde mental. Que acha que depressão e ansiedade são frescura, que quem tem uma casa boa, uma família boa , uma escola boa não tem o direito de sentir a dor da alma…

A culpa pode estar no sistema, que romantiza e impõe para todos nós o seguinte: "trabalhe enquanto eles dormem" ou "não existe tempo para chorar, continue produzindo, produzindo e produzindo".

 

 

O que a gente precisa fazer? Escutar mais e julgar menos. Olhar nos olhos. Ensinar que fracassar faz parte. Que sentir não é fraqueza. Que pedir ajuda é ato de coragem. E, principalmente, cobrar responsabilidade das plataformas que lucram com o sofrimento alheio, mas lavam as mãos quando a tragédia se concretiza.

A vida dos nossos jovens não pode ser moeda de troca por clique.

Eles não estão fracos. Estão cansados. Estão pedindo socorro. E a gente precisa estar disposto a ouvir — antes que o silêncio fale mais alto de novo, porque ninguém devia morrer por não caber num mundo doente.

Eles não deixam bilhete.

Não fazem escândalo.

Não avisam.

Eles vão embora — e a gente fica tentando entender o que não viu.

Carta a uma mãe que perdeu seu filho para o suicídio

Querida mãe,

Eu não conheço seu nome.

Não conheci o sorriso do seu filho.

Mas hoje, escrevo com o coração entre as mãos — porque a sua dor, de alguma forma, também me atravessa.

Nenhuma mãe deveria ter que enterrar um filho. Essa não é a ordem natural da vida. Essa é a ordem da tragédia.

E quando a causa é o suicídio, a dor vem acompanhada de perguntas sem respostas, de culpas que não são suas, de silêncios que gritam dentro do peito.

Eu queria poder te dizer que vai passar.

Mas não passa.

A dor muda de lugar, se transforma. Às vezes adormece, mas nunca desaparece por completo. Porque amor de mãe não morre. E a ausência de um filho também não.

Mas, por favor, escute isso com toda a força que puder reunir agora:

Você não tem culpa.

Você fez o que pôde.

Você amou com tudo o que tinha.

Você tentou entender sinais que às vezes nem existem.

Você foi abrigo num mundo que, tantas vezes, se mostrou cruel.

A morte do seu filho não é falha sua.

É falha de um sistema que não acolhe.

De uma sociedade que ensina a sorrir para as fotos, mas não a lidar com a dor.

De um tempo que cobra excelência e entrega afeto de menos.

Seu filho não foi fraco.

Ele foi forte demais por tempo demais.

Carregou um mundo nas costas até onde pôde. E talvez, o que ele quisesse, no fundo não era morrer,era apenas parar de sofrer.

Você ainda é mãe.

Mesmo com os braços vazios.

Mesmo com o quarto em silêncio.

Mesmo com o coração em pedaços.

Você ainda é mãe, e sempre será.

E se me permite, eu te deixo um pedido:

Transforme essa dor em memória viva.

Fale sobre ele. Diga seu nome. Conte quem ele era, o que fazia seus olhos brilharem, o que ele amava.

O mundo precisa ouvir.

Porque falar sobre isso também é forma de amar.

E talvez, com o tempo, entre lágrimas e lembranças, você descubra que o amor que vocês construíram juntos não terminou.

Ele só mudou de forma.

Agora, vive em cada gesto seu.

Em cada história contada.

Em cada jovem que você ajuda a permanecer.

Você não está sozinha.

E o amor, mesmo na ausência, permanece.

Com carinho,

Alguém que sente com você

Porque o amor de mãe não morre, ele resiste.

Com todo meu amor, Drika Oliveira

(Dedicado à minha amiga Loida Manzo e a seu anjo Enrico Manzo)

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